Desde o fim de Avenida Brasil anseio pela próxima novela de João Emanuel Carneiro, JEC para os preguiçosos íntimos. Sim, sou noveleiro assim como sou viciado em praticamente todo tipo de entretenimento e não entendo muito bem o preconceito que as pessoas tem contra as novelas, mas enfim, isso é assunto para outro post. O fato é que depois de três anos sofrendo a cada capítulo de novelas que enrolavam mais do que faziam acontecer, A Regra do Jogo chega como uma luz no fim do túnel. Nessa coluna, vou mostrar minhas primeiras impressões sobre a nova novela das 22h 21h da Rede Globo. Vem comigo!
Fórmula de Sucesso
Analisando a carreira de JEC, podemos ver um certo padrão no seu roteiro. Para quem não sabe, ele começou sendo autor de novela na Globo com Da Cor do Pecado (19h) e fez também Cobras e Lagartos (19h), A Favorita (21h) e seu maior sucesso, Avenida Brasil (21h). Dentre essas novelas, há uma fórmula de sucesso que JEC usa nitidamente.
Ingredientes:
- Focar na Classe média emergente e/ou Classe alta decadente.
- Vilã loira que fala a verdade, é debochada e exagerada. Se falar mal de pessoas pobres, ganha um bônus.
- Finalizar os capítulos sempre com ganchos que façam o telespectador ficar desesperado pelo próximo.
- Criar personagens com falas bem populares e descoladas.
Misture tudo com vários acontecimentos explosivos, espere até o episódio 100 para fazer um Plot Twist e pronto, aí está seu novelão!
O jogo virou, não é mesmo?
Além da fórmula de sucesso, A Regra do Jogo tem outros elementos que prometem revolucionar a forma que as histórias são contadas nas telenovelas brasileiras tenho fé. JEC parece beber da fonte de séries americanas para tentar quebrar o padrão mexicano das nossas produções nacionais. Com isso, ele trás um gás novo para o público brasileiro que não tem muito contato com as produções dos EUA. Dentre os elementos revolucionários podemos citar:
- Capítulos com nomes
Um recurso que, até essa novela, eu não tinha parado para analisar. Nos EUA, os títulos dos episódios são disponibilizados semanas antes deles irem ao ar e isso serve para os fãs criarem teorias sobre o que vai acontecer. Na novela, mesmo que o título do capítulo seja apresentado apenas no início do mesmo, isso nos faz ficar imaginando o que ele significa. No capítulo de quarta, por exemplo, o título era “Samambaia”. Quando li, fiquei encucado tentando desvendar o que seria. Só quando um personagem disse a palavra é que a ficha caiu.
Além disso, isso reestrutura todo o modus operandi da novela. Novelas, em sua maioria, são feitas de capítulos que isolados não possuem uma história completa, ou seja, com começo, meio e fim. Elas partem do final do último capítulo e não desenvolvem muita história em um capítulo só. Já as séries americanas, possuem mais liberdade entre os seus episódios. Cada episódio tem sua própria trama enquanto desenvolve a trama principal e outras possíveis subtramas. Com os nomes dos capítulos, A Regra do Jogo se aproxima mais do universo das séries porque cada capítulo gira em torno do seu nome, mesmo que a história esteja se desenvolvendo como um todo. Isso muda completamente o ritmo da novela. Cada capítulo passa a ter pelo menos uma história para contar, ao invés de ser apenas encheção de linguiça da trama principal.
- Flashes
Não, não estou falando de Flash de câmera ou dos personagens da DC. Estou falando de Flashback e Flashfoward, recursos muito utilizados por séries americanas. Flashback é utilizado para contar uma história que aconteceu antes do tempo “presente” da história. Já o flashfoward é um salto no tempo para o futuro. Ele mostra o que vai acontecer alguma hora no futuro e volta no tempo para o presente. Os dois recursos são bem interessantes porque tornam a história bem mais complexa. Um flashfoward faz você ficar ligado na história para saber como um determinado evento vai ocorrer e um flashback serve para explicar algo do presente que nunca foi contado. Quando os dois são bem feitos, eles conseguem conectar ações em tempos diferentes, o que mostra, no mínimo, o nível de conhecimento do autor sobre a história dele.
Nessa primeira semana tivemos três exemplos desses recursos. O primeiro capítulo já começou com um flashfoward que mostrava Tóia se entregando por roubar dinheiro. Depois disso, a história volta 10 dias no tempo para nós acompanharmos a trajetória da personagem até o momento do crime. Já no segundo capítulo, tivemos um flashback e um flashback do flashback! Sim, primeiros vimos uma cena que explicava alguns fatos do presente e mais adiante vimos uma outra cena anterior ao primeiro flashback que explicava alguns fatos que não sabíamos sobre a cena do primeiro flashback. Acho que nem preciso comentar que todos os usos desses recursos foram bem executados, não é?
- Trilha Sonora
Saindo do óbvio de colocar apenas músicas conhecidas, A Regra do Jogo aposta também em um instrumental maravilhoso. Ele é responsável por compôr todo um clima. Músicas populares são muito bem-vindas, mas um instrumental bem escolhido é a escolha perfeita para criar uma atmosfera mais densa quando necessário.
Jeitinho Brasileiro
Calma, calma, A Regra do Jogo não é uma produção gringa que estreiou no Brasil, não. JEC pode ter se inspirado em elementos americanos, mas seja na novela ou na produção dela, ele consegue captar o jeitinho brasileiro e usá-lo a seu favor. Podemos destacar:
- Direção
Em Avenida Brasil, Amora Mautner assinou a direção da primeira novela das 21h de JEC e foi consagrada pela câmera tremida que acompanhava os passos dos personagens. A Regra do Jogo retorna com a parceria autor-diretora e trás mais uma inovação chamada de “Caixa Cênica”. Explicando resumidamente, Caixa Cênica é uma forma mais orgânica de captar os personagens em uma cena. Ela coloca os atores dentro de um BBB. Nas novelas normais, há quatro câmeras posicionadas em determinados pontos e os atores tem que se ligar nas marcações das câmeras. Na Caixa Cênica, isso muda completamente. Ela possui oito câmeras que podem estar visíveis aos atores ou não. Isso dá muito mais liberdade para a atuação que foge dos padrões mecânicos. O público pode apreciar as cenas de uma nova perspectiva.
- Personagens
Se existe uma coisa que JEC sabe fazer com maestria é um bom personagem. Ele consegue fugir daqueles personagens batidos que todos já estão cansados de ver: a mocinha boa e trabalhadora, o vilão que é mau feito pica-pau e dá aquela risada típica de vilão “MUUAAHAHAHAHAHAHA” e o príncipe encantado. Ele consegue sair do óbvio e criar personagens essencialmente humanos e factíveis o que nos aproxima da novela. É fácil olhar para qualquer personagem dele e se lembrar de uma pessoa que conhecemos na vida real e isso é um dos grandes trunfos da escrita dele.
Romero Rômulo, protetor dos frascos e comprimidos fracos e oprimidos, heroi do povo e homem digno é na realidade um grande ladrão que usa seu disfarce para proteger seus cúmplices. Quantas pessoas não são assim, até em coisas mais banais? Postam no Facebook que são felizes, mensagens religiosas e filosofias de vida, mas quando nós conhecemos constatamos que não são nada daquilo?
Atena, vilã da vez, não tem cara de vilã, mas de uma típica brasileira que existe aos montes por aí. Exagerada, ambiciosa, metida a rica e arrogante é aquele tipo de pessoa parasita que escolhe vítimas para sugar tudo o que conseguir. Pelo o que eu pude ver, ela não fará maldades do tipo vilanias, mas sim aplicará golpes para sustentar sua ostentação. Existe algo, infelizmente, mais brasileiro que isso?
Tóia, “mocinha” da novela, roubou dinheiro e foi presa para salvar sua mãe da morte. Já de cara provou ser capaz de burlar a lei por uma causa que acha justa. Ela passa bem longe das mocinhas indefesas e delicadas que povoam as novelas mais românticas e que só sabem lamentar e chorar por causa de um carinha que ela conheceu outro dia.
Djanira, mãe biológica de Romero e adotiva de Tóia, foi a minha maior surpresa. Por todo o material de divulgação da novela, achava que ela seria aquela senhora bondosa que todo mundo ia amar e que seria amável com a vida como um todo. Mas não, ela é uma doce com a Tóia, mas é horrível com seu filho biológico. Por mais que seu filho não seja flor que se cheire, mãe acaba sempre perdoando. Só que a relação dela com Romero é algo de outro mundo e ela mostra ter muito ódio dele.
- Abertura
Uma das melhores que já vi até hoje. Ela capta bem a essência dos personagens que descrevi acima. O fato das peças se destruírem e formarem uma peça nem branca e nem preta foi simplesmente incrível. A música escolhida e interpretada fortemente pela Alcione ficou muito boa, mas se eu pudesse mudar, colocaria um bom tango, no nível da abertura de A Favorita que, na minha visão, iria se encaixar melhor.
- Elenco
Pelo o que eu vi até agora, está incrível. Confesso que a princípio não curti o Alexandre Nero como protagonista de novo, já que ele acabou de ser o comendador e isso acabaria desgastando o ator e a novela. Porém, não tem como negar que ele caiu como uma luva no papel e está dando show quando divide a cena com Cássia Kis, que dispensa apresentações. Ela, aliás, faz um sorriso brotar em meu rosto a cada cena que aparece. Sua atuação é impecável.
Uma atriz que está dividindo opiniões é Giovanna Antonelli. Sua Atena é super caricata e exagerada, mas nada que já não tenha passado na televisão. Eu estou achando fantástica a atuação dela e a risada, para mim, é um show a parte. Aliás, cada vez que ela dá aquela risada eu caio na gargalhada. Faz parte da personagem falsa e espero que as críticas não façam ela parar. Quer ver algo exagerado que todo mundo amou e ainda ama?
Mais uma coisa: tente falar essa frase sem respirar, bem rápido e com a desenvoltura da Giovanna: “Meu filho, eu to indo agora prum almoço beneficente que eu to oferecendo para angariar fundos pros desabrigados de uma enchente na Namíbia!".
Além dessas estrelas já consagradas, temos nomes de peso como Tony Ramos, José de Abreu e Renata Sorrah que são garantias de um show a parte na novela.
- Trama
O mote da novela é “Pra você, qual é a regra do jogo?”. Já nessa frase percebemos uma novela com um aspecto filosófico e moral grande. Essa é uma das coisas que mais me chamam atenção em uma história. O quanto podemos absorver dela, o quanto ela pode nos levar a refletir sobre os nossos atos de todo dia. O bem e o mal, o certo e o errado e o limite entre eles. Atrelado a isso, já podemos ver críticas sociais como pessoas cristãs que não se preocupam com vidas, falsos moralistas e alpinistas sociais.
Resumo da Obra
A novela tem tudo para mudar a regra do jogo das produções nacionais e isso é muito bom. É difícil ter que assistir sempre ao mesmo formato de novela. JEC está mostrando que há formas de se reinventar e sair do lugar comum. Agora é esperar para que os outros autores comecem a caminhar no mesmo sentido ou seremos obrigados a esperar mais três anos para saborear uma trama que condiz com o público atual.
E você, o que achou da novela? E da coluna?
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